Da ditadura pra a liberdade!

Olá meninas,

Conforme prometido, toda semana estaremos postando depoimento de cacheadas e como foi todo o processo de aceitação e libertação da ditadura de cabelos lisos.

Hoje, vamos falar sobre a história da Gabriela, 24 anos e psicóloga:

Não tenho nenhuma lembrança infantil do meu cabelo natural, apenas as fotos da minha festa de um ano de idade. Desde muito cedo minha mãe utilizava alisamentos/relaxamentos em mim, mesmo que o salão não aceitasse ela comprava na farmácia e passava. Por longos e longos anos ela testava todo tipo de produto estranho, fedorento e doloroso no meu cabelo. A lembrança mais traumática que tenho foi um dia em que ela passou uma famosa “pasta” no meu cabelo que queimou todo o meu couro cabeludo e quando ela passou o neutralizante senti como se eu estivesse com a cabeça em uma panela de óleo quente. Lembro-me que eu gritava de dor em casa, nessa época eu tinha mais ou menos uns 8 anos. Após esse episódio me lembro de um corte químico sofrido aos 11 anos. Mesmo assim ela não desistia e foi aí que conheci a guanidina. A partir daí até eu decidir parar de usar química fui escrava da guanidina de 2 em 2 meses. 

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Minha motivação de ser natural surgiu junto com uma série de questionamentos sobre minha vida, sobre meu posicionamento político e sobre tudo o que eu acreditava. Eu queria conhecer o meu cabelo, queria que minha futura prole se orgulhasse de sua raça e se aceitasse com a sua beleza, se caso a vontade de mudar algo aparecesse que fosse por uma escolha e não por uma imposição. Porém, eu não sabia muito bem como fazer e como lidar com um cabelo desconhecido. Então, mesmo tomando a decisão de ser natural, demorei um tempo para largar o relaxamento. No início, só o meu namorado estava ciente da minha decisão e sempre me deu muito apoio. O meu último relaxamento foi em Abril de 2014, mas nem eu tinha certeza de que aquele seria o último. Deixei rolar… Nos primeiros 3 meses continuei com a rotina de escova e fiquei pesquisando blogs, vídeos, redes sociais para tentar encontrar experiências parecidas com a minha, mas senti uma imensa dificuldade, pois a maioria das informações que encontrava eram de meninas com os cabelos muito diferentes do meu. Meu cabelo é tipo 4, um misto de 4a, 4b, 4c, então achei complicado adequar o que eu encontrava em todas essas fontes à realidade do meu cabelo, mas decidi ir tentando várias coisas. Ao mesmo tempo estava passando por uma grande mudança em minha vida como um todo, eu tinha acabado de me formar e ainda estava procurando uma direção para minha trajetória profissional. Passando a época da escova, passei a usar o cabelo com coque. Amarrava para traz e fazia coque ou um penteado meio afro que sempre usei quando o cabelo estava saturado de escova. Com 4 meses de transição precisei ir a um baile de formatura e não sabia o que fazer no cabelo, escovei e fui a um salão para fazer um penteado que minha raiz não aparecesse. Quando vi meu cabelo literalmente fritando com a prancha e o spray fixador, resolvi que aquela iria ser a última escova com o intuito de alisar os cabelos que eu faria. E assim foi… A partir daí comecei a saga de procurar algum bom cabeleireiro especialista em cabelos crespos para fazer meu BC.

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Encontrei uma cabeleireira e marquei meu corte para uns dias antes do meu aniversário. Chegando lá a cabeleireira não quis fazer o BC e disse que eu não tinha preparo psicológico para cortar os cabelos tão curtos e fez um corte para que eu pudesse passar a transição de um jeito mais “estiloso”. Eu queria ter cortado tudo, mas gostei muito do corte e passei 3 meses com ele, quando chegou a hora de renovar o corte pensei, vou cortar tudo! Nesse intervalo conheci uma colega de trabalho que também estava em transição e marcamos o nosso BC juntas, porém não foi possível e cortei uma semana depois dela. A sensação? Foi libertador! Eu nunca me senti tão bonita e tão de bem comigo mesma. Acredito que a transição é um processo de aceitação. No meu caso ela foi permeada por mudanças em vários sentidos, então me tornei outra pessoa num movimento de fora para dentro e de dentro para fora. Atualmente estou bem mais perto do que eu acredito ser a minha essência. A palavra empoderamento só se tornou palpável pra mim agora. Passei anos da minha formação trabalhando esse conceito nos meus diversos espaços de prática, mas só agora ele fez sentido em minha vida. Hoje em dia posso dizer que meu cabelo me empodera.

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Quantas de nós não passamos pela mesma coisa? É muito triste viver numa ditadura! Ah, muitas saem da ditadura do liso e vai para a ditadura dos cachos perfeitos. Não acredito que isso seja aceitação, acredito que seja uma fase de “modinha”. Pessoas assim não compreendem o significado de liberdade, não compreende suas raízes e tampouco irá passar valores para futuras gerações.

Beijo amores e até a próxima!

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Uma resposta para Da ditadura pra a liberdade!

  1. Renata Mendes de Oliveira disse:

    Parabéns Gabi!!!
    Imagino que tenha sido difícil, mas sempre soube que você é uma mulher forte e inteligente. Viva a liberdade! Beijos

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